ÁRVORE DO ASSOBIO



A um amigo…

 

Não foi o final da relação. Isso já tinha ocorrido uns meses antes. O que aconteceu naquele dia foi mesmo o fim da linha. Já não havia horizonte para lá do que restou daquelas últimas e definitivas palavras. Foi um novo final, mas, agora, definitivo. Uma sentença que transitou em julgado, sem direito a recurso.

O primeiro final, a antecâmara do definitivo, foi um fim envolto na esperança de um recomeço. Havia uns fumos de futuro e a esperança de um caminho ainda para fazer. Ela mesma considerou e alimentou essa possibilidade. E isso deixou tudo em aberto: no meio daquela súbita inquietação, resistiu uma doce expectativa de recomeço.

Mas naquele dia chegou o que parecia estar para sempre afastado: o fim. O fim com letras marcadas a fogo. As palavras que ali foram ditas não deixaram espaço a equívocos: era mesmo o fim. Para lá desse dia, o horizonte terminava num muro intransponível e numa densa escuridão. Um muro impossível de transpor. Umas trevas que cegavam e desorientavam. Ultrapassá-los estava muito para além de toda e qualquer força.

O mundo, para quem é deixado para trás, é uma coisa estranha e assustadora. Num momento, fica-se indefeso, desvalido, frágil. Pisa-se o chão a medo, como uma criança que se aventura nos primeiros passos, ou como um enfermo acometido de vertigens. Olha-se à volta e não se conhece o lugar onde se está, como se alguém tivesse levado para local incerto as coisas que dão sentido e orientação à vida. Ela amava-o e deixou de o amar. E uma pesada e insustentável tristeza desceu sobre o coração dele.

Uma história como tantas outras, é verdade. Mas, perguntas tu, meu amigo: que mistério profundo e impenetrável se esconde por detrás deste nefasto acontecimento? Que ordem, lei ou acaso desenhou, fez acontecer e desfez esta linda história de amor? Não sei, caro amigo. Ninguém sabe. O que quer que seja que o motivou e o fez acontecer está envolto numa inescrutável obscuridade. Pertence à mesma ordem de desconhecido que se vislumbra no céu nocturno, quando nos interrogamos, sem esperança de resposta, sobre o infinito que desaba sobre as nossa cabeças.

 

Salvador Peres



Lugares mágicos

 

De lugares mágicos está o nosso país cheio. Quem o cruza e conhece, de norte a sul, estendendo-se o olhar às ilhas atlânticas de Açores e Madeira, sabe bem dos tesouros que guarda para quem os quer admirar. Há de tudo neste mosaico de beleza formado pelo triângulo atlântico do continente e ilhas. Há lânguidos rios caseiros e caudalosos rios fronteiriços; remansosos lagos e lagoas; montanhas altaneiras, de onde jorram nascentes que se precipitam em cascatas até aprazíveis vales verdejantes; planícies que se perdem na distância, para lá de onde a vista alcança; uma costa bordada de areias douradas, que vem descendo de Caminha, no Minho, até Vila Real de Santo António, no Algarve; o mar, esse mar que liga o continente às ilhas, que nos abriu horizontes infinitos e nos motivou a navegar até aos confins do mundo; o clima acetinado, o sol e os dias esplendorosos de céu azul, que tanto encantam e atraem os forasteiros.

Comece-se por onde se começar, com destino a qualquer lugar do território, há-de sempre achar-se horizontes de beleza, pequenos recantos encantados, paraísos ignorados, secretas maravilhas.

Um desses lugares, a Serra do Larouco, localiza-se na província de Trás-os-Montes, no concelho de Montalegre, distrito de Vila Real. Nos seus 1535 metros de altitude, a Serra do Larouco é a terceira maior elevação do território Continental, fazendo parte do sistema montanhoso da Peneda-Gerês. Lá bem alto, na Fonte da Pipa, nasce o rio Cávado, que atravessa concelhos transmontanos e minhotos, desaguando no Oceano Atlântico.

Nas primícias de Maio, subi ao cume dessa magnífica e esplendorosa Serra. Encosta acima, a primavera irrompia num colorido de variantes purpúreas, de luminosos violetas e azuis, de seivosos verdes-amarelados, de áureos vermelho-acastanhados. Do alto, em meio de um silêncio prenhe de aromas, a vista, num giro de 360 graus, abarcava os vales do Lima, Tâmega, Cávado e Rabagão, numa aguarela de aldeias espraiando-se na lonjura; lá em abaixo, as terras da vizinha Galiza, cosendo-se com a fronteira da raiana cidade de Montalegre. Lá muito ao fundo, a albufeira da Barragem do Alto Rabagão, com as margens pintadas de amarelo-ocre, sedentas das águas que tardam em brotar dos céus do Barroso.

De lugares encantadores está o nosso país cheio. A Serra do Larouco é um deles. A beleza que dimana daquela sublime escultura montanhosa seduz, atrai e captura os nossos sentidos. Do seu cume tudo quanto se avista está em plena harmonia. Como se a natureza quisesse iniciar ali o traçado perfeito do mundo.

 

Salvador Peres






 

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